segunda-feira, 4 de outubro de 2010

"Suplício de um mesário" ou "Finalmente livre"

Hoje, dia 3 de outubro, dia de eleições, eu acordei ao meio dia e foi fantástico!

Você pode estar se perguntando o que tem isso de tão fantástico. Talvez você tenha o hábito de dormir o dia todo no domingo e nem acordar. Eu te digo que se você tivesse sido mesário em alguma eleição saberia exatamente o tamanho do meu prazer em acordar tão tarde neste domingo. Mas como você provavelmente nunca foi mesário então não tem como saber. Tadinho!

Pra mim isso é um acontecimento! Tente se colocar no meu lugar! Desde quando tirei meu título de eleitor eu trabalhei em todas as eleições e foram 17 anos como mesário entre a primeira convocação e a última. Enquanto todo mundo que eu conheço estava em casa se deliciando com um belo almoço de domingo ou num churrasco com amigos, eu estava comendo bolacha água e sal com tubaína e aguentando eleitores que pensam carregar um rei na barriga. Diz pra mim se é ou não um grande acontecimento dormir até tarde num dia de eleição. Finalmente estou livre!

Mas não estou aqui para falar sobre este domingo e sim sobre o que um mesário tem que aguentar. Quando tudo começou pra mim o sistema eleitoral ainda era feito através de cédulas de papel. Uma tortura! Demorado pra caramba. Dias e dias de apuração. Às vezes até semanas. Sem contar o trabalho na mesa receptora. Contar todas as cédulas em branco, separar as 10 primeiras a ser usadas, numerá-las de 1 a 10 e dobrá-las. Utilizá-las para começar a votação e só depois de terminado o primeiro lote de 10 numerar as próximas 10 e daí por diante até às 17 horas. Perdeu o fôlego? Imagina então os mesários de antigamente! Coitados!

Em 1996 a coisa começou a ficar mais fácil com a urna eletrônica. Porém não diminuiu a chatice dos eleitores. Por que será que os latino-americanos tem a mania de achar que tem um rei na barriga e que precisam se mostrar superiores a quem está servindo de alguma forma? E por que o rei na barriga revolve dar chutes justamente na hora em que o bendito chega à seção eleitoral? Por que será que todo mundo acha que os mesários são seus subordinados. Será que ninguém sabe que no dia das eleições em autoridade acima do presidente da seção eleitoral está apenas o presidente do Brasil? Ninguém sabe que o presidente da seção eleitoral pode dar voz de prisão e o policial responsável pelo colégio eleitoral é obrigado por lei a acatar a decisão do presidente?

Pois é isso! Eu, como presidente de seção eleitoral, nunca deixei de exercer a minha autoridade. Exigia respeito. Quem me conhece sabe que a pior coisa que pode acontecer ao mundo é colocar poder em minhas mãos. Eu seria um ditador, cobrando ordem, pontualidade, obediência e, principalmente, silêncio dos eleitores. Como presidente de seção, fiquei conhecido como o terror das criancinhas, entre outras coisas. Eu nunca permiti que os eleitores levassem seus filhos, ou qualquer outra pirralho ou acompanhante, até a urna. Todo mundo alega que este ou aquele candidato lazarento apareceu na televisão votando acompanhado por uma criança. Gente! O voto é secreto e individual! Ninguém pode votar acompanhado! Segundo a lei um cidadão só está apto a votar a partir dos 16 anos! É tão difícil de entender isso?

Eu sempre fiz a lei ser cumprida. Já fui ameaçado por muitos pais, mas nunca me abalei e fiz valer minha autoridade e meu poder, visto que eu não liberava o voto até o eleitor fazer a criança se afastar da urna. Já vi muitas crianças saírem chorando da minha seção. E eu adorei!

Tem também aqueles eleitores que se acham muito espertos e justamente por isso não se preocupam em aprender a votar. Acontece que aí chegam à frente da urna e não sabem o que fazer. Muitas vezes os espertinhos não sabem nem os números dos candidatos. Então os mesários devem disponibilizar uma lista de candidatos para o eleitor fazer uma consulta. Até aí, tudo bem, mas custava o senhor sabe tudo ter feito essa consulta, ou ter perguntado pra alguém, antes de ir votar? Eu acho que o sabichão sente prazer em ver os outros eleitores na fila esperando a vontade dele. Só pode ser isso.

Mas se eu ficar aqui falando só dos péssimos eleitores não serei um presidente justo. Essas frutas podres são apenas a minoria. A maioria dos eleitores, felizmente, é composta por pessoas interessadas de verdade no ato do voto, na democracia. E isso independe de preferências partidárias. Somos irmãos lutando para melhorar nosso país. No entanto, é impossível não prestar atenção aos abismos sociais. Do mais rico ao mais pobre, do mais instruído e consciente de sua cidadania até aquele que não tem instrução alguma e não tem a mínima noção de sua condição de cidadão.

Uma vez presenciei uma cena que me abalou. Ao oferecer a caneta a uma senhora para assinar o livro de presença, ela me disse que não sabia escrever. Fiz de tudo para agir com naturalidade, pois percebi o constrangimento dela. Fiz sinal para o mesário que estava na porta para não deixar mais ninguém entrar. Fui até a bolsa que continha o material de votação, peguei a almofada de carimbo e ofereci para está senhora molhar o polegar e marcar sua digital no livro. Acho que agi da melhor forma possível nesse momento e em outras eleições nas quais esta senhora compareceu.

Eu realmente fiquei muito sensibilizado. Nunca antes eu havia conhecido uma pessoa que não sabe ler e escrever. Pedi, então, para um mesário ficar em meu lugar e fui ao banheiro e lá chorei. Chorei por essa senhora e tantas outras pessoas que não sabem ler. Não consigo imaginar a extensão dos problemas que isso pode causar na vida de uma pessoa, mas não pude deixar nesse momento de questionar o Ser Supremo, quem quer que ele seja, e a todos os políticos que já exerceram um cargo público em nosso país. Questionei a mim mesmo. O que nós todos fizemos, ou fazemos, para melhorar a vida dessa senhora que não sabe ler e escrever e que mesmo assim faz questão de votar? O que nós fazemos para ajudar quem precisa de ajuda? Será que estamos sendo cidadãos verdadeiros ou só exercemos a cidadania para proveito próprio?

Eu ainda não sei a resposta, ou pelo menos não sei a resposta completa, mas sei que quero acreditar num país melhor. Quero acreditar que seremos melhores. Quero acreditar que teremos políticos melhores, menos mesquinhos e mais interessados em realmente fazer o melhor. Tenho esperança num país melhor hoje, agora. Todo mundo diz que o Brasil é o país do futuro, mas precisamos parar com isso. Temos que parar de empurrar pro futuro o que é preciso ser feito agora. Eu não quero viver num país do futuro. Quero um país do presente, do já, do imediatamente. Estou querendo demais?

Mas, depois do desabafo e voltando pra seção eleitoral, é claro que um dia de eleição não é feito só de chateações. Todo tipo de pessoas passam por uma seção eleitoral. Todas as cores, todas as tribos, todos os credos e todas as convicções políticas. Acabamos por isso conhecendo ou conversando com pessoas com as quais nunca conversamos antes. Fazemos amizades, contamos piadas, falamos mal dos políticos (só quando não há eleitores por perto) e fazemos a democracia. Isso, por si só já é reconfortante. Saber que o seu trabalho nesse dia ajudou de certa forma que a democracia fosse exercida é uma recompensa que suplanta, e muito, as horas fora de casa. Saber que com esse dia que dedicamos ao nosso país estamos sendo cidadãos e patriotas é uma fonte de orgulho. Somos todos iguais, nem que seja apenas diante da urna eletrônica. Pensem em países onde o povo não tem o direito de votar, de escolher, de decidir, onde alguns poucos, pro bem ou pro mal, decidem a vida de uma nação inteira. Poucas coisas são mais tristes que isso.

Hoje fui votar após o almoço. Adivinha o que aconteceu! O presidente que me substituiu estava perdido, coitado, e me pediu várias explicações. Senti o maior prazer em ajudar. Depois reencontrei colegas de urnas e batemos um bom papo. Foi muito bom ser apenas eleitor dessa vez, mas tenho que aproveitar e fazer minha confissão eleitoral. Vou sentir muita falta de tudo isso. Fui embora da seção me sentindo como se não tivesse contribuído como cidadão para a democracia. Ficou um vazio. Deu uma vontadezinha de voltar... kkkk

Me despedindo, e aproveitando, faço aqui um pedido a você. Nas próximas eleições não deixe de votar. Escolha bem seu candidato e não vote nulo ou branco. Se não por seu país, então pelo menos em respeito aos mesários que irão te receber na seção eleitoral. Se possível, leve um lanchinho para os coitadinhos. Nós agradecemos.



"Minha Nossa Senhora da Urna eletrônica, orai por nós!"

Sandro Carvalheira - 03-10-2010 - domingo - 11:16 p.m.

quarta-feira, 15 de setembro de 2010

Por que escrever esse blog?

Sinceramente, acho que não sei ao certo a resposta, mas sempre quis botar no papel coisas que penso, que sinto, que amo, que odeio, que quero esquecer e principalmente as que quero lembrar. Mas eu sempre fui tão antenado com os vícios tecnológicos que acaba sendo muito mais fácil fazer isso no mundo virtual.

Estou me propondo a escrever aqui para fazer confissões, mas na verdade talvez isso venha a ser um livro de memórias, o que não deixa de ter algo de confessionário. É, talvez seja isso. O bom e velho confessionário que nos é enfiado goela abaixo pela criação católica que muitos de nós tivemos.

E falando de catolicismo, seus termos e instrumentos de tortura, já deixo aqui bem claro que tenho todos os tiques nervosos, medos e vícios moralistas de quem foi criado numa sociedade cristã. Infelizmente, ou felizmente, luto contra todos essas algemas a muito tempo, mas no fundo sempre acabo me sentindo uma velha beata, vestida de preto, corpo ereto e olhar reprovador. Ai, como eu sofro!

Voltando aos meus motivos para escrever, acho que tudo tem muito com o fato de eu ser um pouquinho viciado em leitura. Às vezes me pego no meio de algum livro pensando, esquecendo da leitura, que talvez eu também tenha algo que contar. Adoro estorinhas... rsrsrs!

Hoje mesmo acordei as quatro da madrugada com minhas cachorras latindo desvairadamente por causa do jornaleiro e não consegui dormir mais. Então, como sempre, abri o livro que estou lendo no momento e abandonei este mundo. O livro em questão é a trilogia O Tempo e o Vento do Érico Veríssimo que estou relendo. Aliás, é a terceira vez que leio essa trilogia.

Tudo bem, aqui vai minha primeira confissão: sou meio over com minhas manias e quando gosto de um livro, ou filme, ou música, ou assunto, ou alguém, consumo em excesso. Eu nunca disse que sou normal ou que tenho a mente sã. Não me recriminem!

Pois bem, estou quase no fim da releitura da trilogia. Mais exatamente no capitulo intitulado "Diário de Silvia", que como o nome diz, é escrito como anotações do diário dessa personagem. Me identifico tanto com essa menina e com a forma como ela escreve em seu diário que também quis escrever. Pronto falei! E eu nunca disse que não sou invejoso ou que sou o rei da originalidade. Alias, tenho uma simpatia pela pirataria.

Aproveitando, e pra encher linguiça, quero escrever aqui um trecho Do Diário de Silvia que li hoje e que espero que quem vir a ler meu blog goste e sinta vontade de ler o livro:

Um talho pode não doer muito na hora em que é produzido, mas deixa uma cicatriz que, bem ou mal, a gente carrega vida em fora... Uma cicatriz que em certos dias comicha e nos leva a pensar na pessoa que nos feriu.”

Tá bom pra você?!

Érico Veríssimo é foda!

Beijos e até a próxima!

"O TEMPO E O VENTO"

Sandro Carvalheira - 15-09-2010 - quarta-feira - 08:28 a.m.